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Augusto Maciel Neto

Augusto Maciel Neto vive na região do ABc há mais de 50 anos. Foi ator em muitos grupos amadores da região e também do teatro profissional. É diretor da Cia. TECO em Santo André. Imagem do Depoente
Nome:Augusto Maciel Neto
Nascimento:03/11/1937
Gênero:Masculino
Profissão:Ator
Nacionalidade:Brasil
Naturalidade:Ibitinga (SP)

Transcrição do Depoimento de Augusto Maciel Neto em 07/07/2003
Depoimento de AUGUSTO MACIEL NETO, 64 anos.

Universidade Municipal de São Caetano do Sul, 07 de julho de 2003.               

Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC 

Entrevistadores: Vilma Lemos e Vanessa Guimarães de Macedo.

Transcritores: Meyri Pincerato, Marisa Pincerato e Márcio Pincerato.

 

Pergunta:

Sr. Maciel, conta onde o senhor nasceu, como foi sua infância?

 

Resposta:

Eu nasci em Ibitinga, Estado de São Paulo. Minha infância foi como a de toda criança nascida no interior, de classe média, média mesmo, não é classe média alta não, classe média, e sem grandes acontecimentos, sem grandes novidades. Uma vida de criança, desde que eu nasci até ir para São Paulo. Eu vim com 7 anos para São Paulo e em São Paulo eu saía mais. Morei na Penha por muito tempo, depois vim para Santo André. Estou aqui até hoje e continuo na minha luta.

 

Pergunta:

Com quantos anos o senhor veio para cá?

 

Resposta:

Vim com 15 anos. Eu morava na Penha e trabalhava na Firestone. Trabalhei aqui 5 anos fazendo minha casa na Penha. Meu pai, que também trabalhava na Firestone, resolveu mudar para Santo André que ficava mais fácil.

 

Pergunta:

O que o senhor fazia?

 

Resposta:

Eu entrei como office-boy na Firestone, tinha uns 14 anos; depois, de office-boy, passei para auxiliar de departamento de engenharia, fiquei uns cinco ou seis anos trabalhando na Firestone. Comecei a mexer com teatro logo que mudei para Santo André.

 

Pergunta:

E do tempo de criança, que brincadeiras  tinham, fazia, quando era criança ?

 

Resposta:

Era brincadeira de moleque. Eu não tenho muita recordação de brincadeira, mas o que eu me lembro era brinquedo que eu tinha, dos meus irmãos e alguns amigos que a gente tinha lá no interior; depois eu mudei para Santo André e a coisa ficou um pouco mais urbanizada: jogar bola, brincadeiras de criança mesmo, grandes recordações.

 

Pergunta:

Como era a escola?

 

Resposta:

A escola. Eu sempre fui bem, modéstia à parte. Eu me lembro que no primeiro ano da minha infância eu ganhei um concurso de redação da classe. Eu sempre fui bem em redação, sempre fui de escrever bem, tanto é que eu tenho mania de fazer texto, eu já fiz diversos textos de teatro e, no ano passado, quem ia imaginar, escrevendo para teatro, estivemos em alguns lugares e fui muito bem recebido, recebi diversos prêmios em festivais.

 

Pergunta:

O senhor  estudou até que ano?

 

Resposta:

Eu fiz até o ginásio; depois fiz até o segundo ano do científico, na época tinha científico; saí do científico e fiz até o segundo ano do normal; saí do normal e parei de estudar, acabei concluindo curso nenhum.

 

Pergunta:

Sua paixão pelo teatro, como foi?

 

Resposta:

A paixão pelo teatro veio depois de um tempo morando em Santo André. Conheci a família Aníbal, Aníbal Guedes e a Sônia Guedes, ela é atriz até hoje, atriz de sucesso, e o marido dela que infelizmente faleceu muito jovem era um grande ator também, e a gente fez umas peças de teatro. Estreei na cultura, na SCASA Sociedade de Cultura Artística de Santo André, com a  peça Passando Por Isso que era dirigida pelo falecido Antônio Chiarelli e também o participava Paschoalino Assumpção, que morreu recentemente.

 

Pergunta:

O senhor tinha quantos anos?

 

Resposta:

Eu devia ter uns dezenove ou vinte anos; vinte e poucos anos.

 

Pergunta:

Quando jovem, como foi a sua juventude, diversão, cinema? Tinha rádio, tinha cinema, TV?

 

Resposta:

Eu gostei sempre de rádio, sempre foi minha paixão, tanto é que a minha formação teatral foi ouvindo novela. Eu me lembro de novelas, hoje em dia não tem mais.

 

Pergunta:

Que novelas?

 

Resposta:

Eu ouvia todas as novelas da rádio de São Paulo, desde criança.

 

Pergunta:

O senhor se lembra de alguma novela?

 

Resposta:

Lembro de uma que chamava Rincão Crioulo, a outra era (inaudível), eram muito bonitas as novelas de rádio. Era o único meio que tinha, então, minha formação foi ouvindo novela. Eu era muito fanático por novelas desde moleque, desde criança, Ouvia aventura, tinha teatro de aventura com Odair Manzano, Rocha, Jorge Navarro, todo o pessoal que estava em rádio e minha formação foi de ouvir novelas porque eu acho que é um meio que você, você cria muito mais, é um meio que você está ouvindo. Televisão te dá coisa pronta para você ver, não tem que imaginar nada. E no rádio a gente imaginava, se era um rio você imaginava o rio que você queria, se era uma casa, a casa que você imaginasse. Então a sua imaginação era muito mais aguçada. Eu acho que era muito importante por isso. Hoje em dia vem tudo mastigado, tudo pronto, você não tem que pensar em nada.

 

Pergunta:

E essas rádios-novela tinham uma propaganda?

 

Resposta:

Propaganda. Acho que Gessy, Gessy Lever tinha alguma coisa, tinha das famosas. Não lembro de nada agora. De modo geral as propagandas não eram essas coisas.

 

Pergunta:

E funcionavam?

 

Resposta:

Acho que até hoje funciona. Tem a das Casas Pernambucanas. Casas Pernambucanas, eu lembrei a loja, que participava de muita coisa. Agora eu acho uma das casas do mercado mais vendidas do Brasil.

 

Pergunta:

O senhor ia a baile, como era?

 

Resposta:

Adorava baile. Adorava, sempre gostei de baile.

 

Pergunta:

Que tipo de música tocava?

 

Resposta:

Naquela época tinha muito twist; todo bailinho de garagem era só twist.

 

Pergunta:

Lembra dos cantores?

 

Resposta:

Chubby Checher, aquela turminha toda do twist. O rock and'roll  também na época do Elvis Presley, época dos Beatles, e a gente ia muito ao Aramaçan, Rhodia, Primeiro de Maio. Eu fui diretor social do Primeiro de Maio e a gente promovia muita coisa, bailes, shows, queriam teatro no Primeiro de Maio, e a gente participava de tudo quanto era coisa. Era uma época muito mais sadia que agora. Agora é tudo perigoso, tudo arriscado, você sai à noite é arriscado, você chega de dia... Na nossa época, época do Moinho São Jorge, gente andava a pé esse pedaço aqui  da estação até o Moinho São Jorge de noite, de madrugada, não se ouvia falar nada, nada de roubo, nada .

 

Pergunta:

Vocês iam a pé?

 

Resposta:

A pé.

 

Pergunta:

Não tinha condução?

 

Resposta:

Não tinha condução nesse pedaço.

 

Pergunta:

Como era a roupa?

 

Resposta:

A roupa era sempre formal, de terno. Nesses bailes geralmente no Moinho São Jorge, a rigor, a gente tomava banho de farinha, de pó de farinha até chegar lá em cima.

 

Pergunta:

Se ia a pé, em que estado ficava o sapato?

 

Resposta:

Você sabe que... Acho que era calçada essa rua do Moinho São Jorge naquela época, já era calçada, não sei se era de paralelepípedo ou se era asfalto, mas era calçada e não tinha esse problema. A gente também nem imaginava essas coisas. Chegava, passava um pano no sapato para tirar o pó da da farinha que tinha e o baile lá era maravilhoso. Quem não conheceu é uma pena.

 

Pergunta:

E questão de namoro, casamento?

 

Resposta:

Nunca me casei, não casei.

 

Pergunta:

Não quis?

 

Resposta:

Não quis casar.

 

Pergunta:

Mas como era?

 

Resposta:

Eu acho que o casamento não tem diferença, só que era um pouco mais formal. Hoje em dia, a mulher avisa o pai que vai casar e a coisa era um pouco mais cerimoniosa. O casamento, hoje, já não é como no meu tempo ou mais para trás, que devia ser pior. Na década de 30 ou 40 devia ser bem mais complicado, mas na época eu não tinha intenção, mas era um pouco mais formal. Recordo-me que era um pouco mais formal, não era tão informal como hoje, casava mesmo. Hoje em dia não se casa mais, fica junto, não dá certo vai embora, quando casa, fica um ano casado e depois acaba.

 

Pergunta:

Quando era jovem, como era a questão do primeiro emprego?

 

Resposta:

O primeiro emprego, como eu já falei, foi na Firestone. Entrei como office-boy.

 

Pergunta:

Como era esse emprego?

 

Resposta:

No primeiro emprego era corrido, corria a fábrica toda entregando correspondência e pegando correspondência, que era o serviço de office-boy, eu era office-boy interno, só fazia serviço lá. Como a firma era muito grande, saía uma vez de manhã, uma vez de tarde com uma pasta sanfona e ia recolhendo toda a papelada do escritório e resdistribuindo para onde elas deviam ir.

 

Pergunta:

Quantos anos o senhor tinha?

 

Resposta:

Eu tinha 14 anos

 

Pergunta:

E ficou quanto tempo?

 

Resposta:

Eu trabalhei seis anos na Firestone.

 

Pergunta:

Era registrado?

 

Resposta:

Sim, desde o primeiro dia.

 

Pergunta:

E saiu da Firestone para trabalhar onde?

 

Resposta:

Depois que saí da Firestone, trabalhei em diversas firmas, trabalhei na GM, Mercedes Bens, trabalhei em diversas firmas, nunca fui de parar muito em um lugar. Abri uma loja em Santo André, que foi a primeira  botique que teve em Santo André chamada Candelabro, só para homens, que era o maior sucesso na época, era a marca da minha loja, fiquei ali nove anos com a loja, depois virei sócio e acabei não me entendendo, mas nossa loja fez muito sucesso.

 

Pergunta:

Tinha roupa variada?

 

Resposta:

Roupa só masculina, calças, camisas, tudo coisa fina, foi a primeira botique de Santo André.

 

Pergunta:

Onde ficava?

 

Resposta:

Na Cesário Motta, lá onde era U.F.O.S. Som e hoje em dia está um barzinho.

 

Pergunta:

O senhor fez exército?

 

Resposta:

Não.

 

Pergunta:

Tiro de guerra ?

 

Resposta:

Não.

 

Pergunta:

Já na fase adulta, como foi o trabalho?

 

Resposta:

Eu continuei trabalhando em firma, passei pelo departamento pessoal, selecionador de pessoal, trabalhava em firma até que eu abri a loja, fiquei nove anos na loja e depois que eu saí, trabalhei acho que seis ou oito anos na Prefeitura como funcionário, não era de carreira. Como fala quando você entra no tempo do mandato? Era funcionário. E trabalhei na Prefeitura uns oito anos, nas duas gestões do Dr. Brandão.

 

Pergunta:

Agora vamos para o teatro.

 

Resposta:

Já continuava fazendo teatro. Teatro eu já faço, meu grupo já está com trinta e trinta e três anos. Sempre trabalhando sempre fazendo alguma coisa.

 

Pergunta:

O senhor participou de alguma greve?

 

Resposta:

Não participei. Eu sempre fui, participei mas pela paralisação, nunca fui de movimento grevista, de estar no meio do sindicato. Parava porque o sindicato obrigava a parar, então parava, entrava na greve também, trabalhei muitos anos na GE,  então se tinha greve, fazia greve forçada, não era do movimento.

 

Pergunta:

O senhor tem irmãos?

 

Resposta:

Tenho irmãos; minha mãe faleceu nova, meu pai faleceu o ano passado.

 

Pergunta:

Tem irmãos?

 

Resposta:

Tenho irmãos, irmã.

 

Pergunta:

Quantos?

 

Resposta:

Nós somos seis, só um irmão meu que faleceu.

 

Pergunta:

Alguém seguiu a carreira artística?

 

Resposta:

Ninguém.

 

Pergunta:

Teatro apenas o senhor?

 

Resposta:

Apenas eu.

 

Pergunta:

O senhor se lembra do golpe militar de 64?

 

Resposta:

Lembro.

 

Pergunta:

Como o senhor sentiu, como o senhor relata esse tempo?

 

Resposta:

Esse tempo foi um tempo muito cruel para quem fazia arte, de modo geral a cultura foi muito abalada com o golpe de 64, porque atingiu muitos meios teatrais, musicais, artísticos e tudo muito censurado, tudo muito trancado e vigiado. Teve seu lado bom também, acho que pode ser considerado lado bom, foi que aguçou um pouco a classe artística. Eu acho que na época da repressão se fez mais do que após a liberdade, a queda do do golpe militar. O pessoal parece ficava aguçado, escrevia mais coisas tentando falar coisas de outras maneiras, tentando driblar a censura. Parece que o movimento cultural ficou mais atento, mais aguçado. Hoje em dia não, mas os principais autores do teatro surgiram quase todos na época do AI-5, do Ato Institucional. E mesmo as músicas. Os atores e cantores foram censurados, falavam coisas através de metáforas. Foi muito mais inteligente.

 

Pergunta:

O senhor teve alguma peça censurada?

 

Resposta:

Não, censurada não, mas a peça já. Era complicado no tempo da censura, porque você escrevia uma peça, tinha que pegar o texto, levar para a censura, a censura lia, fazia a primeira censura, cortava trecho, palavra, às vezes até a página toda, devolvia o texto, você montava o espetáculo, você era obrigado a ir até a censura, marcar um dia e pegar o censor, ele assistia ao espetáculo para ver como estava, se aprovava ou não; se estivesse como alguma coisa errada, eles cortavam. Então, tinha que primeiro fazer uma censura escrita, depois uma censura visual, aí eles liberavam o espetáculo. Era muito chato, muito trabalhoso, porque tinha que ir lá buscar, era obrigado a buscar o censor onde você morasse, levar de volta, tinha marcar um dia e buscar o censor, e isso era por conta do grupo. Se tivesse carro, ia de carro; se não tivesse, alugava ou pegava táxi. Era complicado.

 

Pergunta:

Eles cobravam?

 

Resposta:

Não, não cobravam, era obrigação deles, era o trabalho deles, mas aquilo era trabalhoso.

 

Pergunta:

O senhor se lembra de alguma coisa, de alguma peça que foi censurada?

 

Resposta:

Eu era muito novo. Eu me lembro que, quando morava na Penha, chegaram os pracinhas, eles vieram e passaram lá onde a gente morava, e eu fui assistir à chegada deles. Eu era criança. Eu lembro que cheguei a ver um desfile deles, quando chegaram no Brasil.

 

Pergunta:

Como surgiu o teatro na vida do senhor?

 

Resposta:

Surgiu por causa desses amigos que eu falei, da Sônia Guedes e do marido dela. Eu ia muito na casa deles e a gente ficava discutindo até de madrugada, grande parte do tempo discutíamos, eles já faziam teatro, então eu comecei a me interessar. Acabei trabalhando com eles numa peça e daí para diante eu segui. Eu trabalhei profissionalmente no GTC - Grupo Teatro da Cidade e sempre paralelamente com o meu grupo. Então deixei de fazer teatro profissional para continuar fazendo teatro amador, porque eu gostava, eu dirigia, então fazia o teatro profissional, e acabei parando para continuar o teatro amador.

 

Pergunta:

E dava para viver disso?

 

Resposta:

Não, não. Teatro infantil dá um pouco para viver disso, mas teatro adulto é mais complicado, a não ser quando você faz espetáculo dirigido para escola, você consegue vender. Fazer por prazer, viver de teatro adulto é complicado; teatro amador, hoje em dia, os profissionais vivem bem, aqueles da Rede Globo, qualquer ator faz uma peça, faz uma novelinha lá, depois sai numa peça e sai ganhando dinheiro.

 

Pergunta:

O senhor se lembra de histórias do homem na lua? Como isso ficou para o senhor?

 

Resposta:

Eu me lembro, mas assim como todo mundo lembra, de ver na televisão, de acompanhar nos jornais, mas nunca cheguei a me entusiasmar muito com essas coisas.

 

Pergunta:

E com os movimentos políticos, como Diretas Já, greves?

 

Resposta:

Eu sempre participei mais como observador, nunca participei diretamente. Eu nunca me envolvi muito com política, eu não tenho tempo para isso, acho que não sou político fervoroso, tenho meu candidato, mas nunca fui de participar disso.

 

Pergunta:

O senhor não faz teatro político?

 

Resposta:

Não. Quase todo teatro tem política, mas não uma política engajada, de querer atacar isso ou orientar para aquilo. Não faço teatro político, o texto pode ser político, você pega um Black-Tie, Gimba, Vereda De Salvação, são textos que falam de política, mas não que seja um texto engajado que eu esteja fazendo porque quero agradar o sindicato, o PT ou PTB, ou quem quer que seja. Eu faço porque eu gosto, porque o público gosta, sem essa preocupação com a política.

 

Pergunta:

A sua produção é mais voltada para criança ou para o público adulto ?

 

Resposta:

A gente faz para os dois. Eu fazia antigamente mais para adulto, depois comecei a fazer bastante infantil, é um jeito de você poder ganhar alguma coisa com o teatro infantil. Você pode fazer uma peça bonita e bem feita e a pessoa adorar, mas não tem o apelo comercial, não tem nome de peso; mesmo que seja uma porcaria, você faz uma peça com fulano de tal, o povo vai porque tem o apelo comercial da televisão. Infelizmente o teatro amador às vezes tem grandes espetáculos e não tem público, o público não se interessa muito, não tem nada que chame a atenção para ele ir; mesmo que ele vá, adore, goste mais que a outra que ele viu, mas ele não vai.

 

Pergunta:

Qual o nome do grupo?

 

Resposta:

Teco, Teatro e Comunicação.

 

 

Pergunta:

Quantas pessoas têm no grupo?

 

Resposta:

Fixos deve ter uns doze ou quinze.

 

Pergunta:

Tem convidados?

 

Resposta:

Varia muito de acordo com o que você vai fazer. Tem peça que tem vinte e três, já fiz peça com vinte e dois, vinte e três elementos, então, você pega mais alguém, tem muita gente que entra e sai do grupo, entra para uma produção, para uma peça, depois se afasta, entra outro, então tem o núcleo do grupo, que tem doze, quinze, que são sempre os mesmos.

 

Pergunta:

Como foi essa experiência de teatro no Primeiro de Maio?

 

Resposta:

Foi muito boa. Aliás, a primeira peça que dirigi foi no Primeiro de Maio, dirigi Santo Milagroso. Foi muito bem. De lá saiu Henrique Lisboa, Taubaté, Silvia Borges, são atores profissionais. Silvia Borges eu conheci quando ela foi trabalhar comigo, ela tem o único prêmio, aquele prêmio que é dado pela França, Mollier. Ela é a única mulher de Santo André que ganhou o Mollier, no tempo em que o Mollier era o maior prêmio do teatro. Foi muito gostoso, porque era uma época que eu participava do muito do Primeiro de Maio, eu era diretor social, tinha o grupo de teatro lá que eu tocava, fizemos Arena Canta Zumbi, no Primeiro de Maio, fizemos essa que eu falei Santo Milagroso, fizemos Morre um Gato na China, então, fazíamos show todo mês. Começamos fazendo mensal e depois passamos a fazer semanalmente. Inclusive tinha muito cantor que dançava, interpretava, fazia um show, um showzinho que era muito freqüentado, lotava. O pessoal gostava muito, era um trabalho bem feito, a gente fazia com muito carinho e porque gostava também, não dava lucro, não dava nada. Era por prazer.

 

Pergunta:

O senhor escreve, dirige e produz?

 

Resposta:

No meu grupo sim, agora eu não só escrevo, de vez em quando um texto meu, mas normalmente a gente faz textos variados.

 

Pergunta:

Como é, hoje em dia, colocar uma peça em cartaz?

 

Resposta:

O nosso grupo tem um fundo de caixa, não é grande coisa, mas a gente está sempre circulando com esse fundo de caixa. Quando a gente monta uma peça, a primeira coisa que você faz é tirar o que você gastou, você devolve um pouquinho. Depois, se der alguma coisa, você divide entre os atores, mas sempre com essa preocupação de retirar o que foi gasto, para sempre ter um fundo, para poder movimentar e fazer alguma coisa, se não é complicado. Felizmente nós temos uma sede que um amigo nosso administra, praticamente cedeu para a gente, um espaço grande, aliás dois espaços, um aqui no centro, na Rua Onze de Junho, e um lá no Centreville que é um salãozinho maior onde dá para ensaiar, fazer marcação, guardar figurino, guardar cenário, guardar tudo lá. Aqui a gente usa mais para ensaio mesmo.

 

Pergunta:

As pessoas desse grupo de teatro vivem disso ou têm outras atividades?

 

Resposta:

Não. Todos têm atividades. Alguns têm atividades paralelas com o teatro, eles fazem teatro de indústria, teatro de animação, esses vivem de teatro, mas a maioria não, a maioria tem profissão, trabalha, faz teatro por amor, mais por hobby mesmo, por lazer.

 

Pergunta:

Que movimentos da história, da sociedade do Brasil ou do mundo, foram marcantes na sua história de vida, por exemplo, o assassinato do Kennedy, Elvis Presley?

 

Resposta:

Eu acho que o que mais me abalou foi o assassinato do Kennedy, foi uma das coisas com a qual eu mais me emocionei, por ver o absurdo, sentir aquela coisa, como é que pode tirar a vida de alguém que nunca fez o mal a ninguém?! Pelo menos na concepção dele era fazer o bem. Pode ser que dentro dessa concepção de fazer o bem, pudesse estar causando prejuízo também logicamente e ele foi assassinado.

 

Pergunta:

O senhor é um homem do teatro, mas como a televisão surgiu na sua vida?

 

Resposta:

Inicialmente era novidade, era muito interessante você ver. Uma coisa era ouvir, outra coisa era sentar e assistir. Eu me lembro que fiquei muito interessado quando vi a primeira partida de futebol na televisão, porque sempre tinha gostado muito disso. Como pode você ver a imagem da pessoa! Então aquela admiração que acho que todo mundo teve, aquele impacto que ela era naquele momento e como foi mais recentemente a televisão em cores. Puxa vida! De branco e preto agora aparece colorida, logo vai sentir perfume, sentir mais o quê. A imagem vai sair do vídeo e vão inventando coisas e a gente vai acompanhando. Eu fiquei lembrando, eu acho que o meu impacto foi o da maioria, pela época, todo mundo tinha interesse de assistir alguma coisa na televisão, ia a um barzinho. Depois a coisa vai ficando mais comum, todo mundo compra.

 

Pergunta:

O senhor prefere a televisão ao rádio?

 

Resposta:

Eu acho que não. Na minha concepção, é muito melhor ouvir pelo rádio do que ver. Eu acho que é muito mais criativo. Dependendo de cada pessoa, por causa disso, você constrói o cenário que você quer, a sua imaginação, o personagem que você imagina, não o que você vê. Então eu acho assim que era mais importante a novela da rádio do que a novela da televisão. Eu sei que tinha criatividade, eu lembro de truques que eles faziam na rádio, para parecer barulho de chuva, cavalo, era tudo mais criativo, mais engenhoso. Você ouvia aquilo e passava como se fosse aquilo que você estivesse ouvindo, aquilo que você imaginava era aquilo que você queria ver. Era até melhor. Eu já gostei de novela, hoje não gosto, não assisto novela, virou uma bobagem, é tudo igual, sempre a mesma coisa, você não vê novidade. Por incrível que pareça, quem consegue, embora muito mal feita, mas quem mantém um pouco de pudor é a novela mexicana. Pode criticar, falar mal, que a produção não é grande coisa, mas eles mantêm pudor. Nessas novelas mexicanas você não vê bobagens, você não vê essas mulheradas como você vê na novela brasileira que mostra tudo, uma anda com outro. Virou uma sacanagem. Eu não tenho nada contra, pelo contrário, mas eu acho que é muita prosmicuidade para as crianças. Todo mundo vive bem, todo mundo tem casa bonita, então, foge da realidade, fica uma coisa muito bonita, todo mundo é rico, todo mundo é bonito. Eu achei que as desgraças das  novelas viraram uma besteira. Quando a gente assiste ao primeiro capítulo e já sabe o que vai acontecer no último, não adianta ficar enchendo a história no meio, porque a gente já sabe o que vai acontecer, quem acaba com quem, quem fica, quem não fica.

 

Pergunta:

O senhor deve conhecer a história do Teatro Alumínio em Santo André? (Assentimento) O senhor tem alguma lembrança?

 

Resposta:

Tenho, porque eu comecei no Teatro de Alumínio, mas ele já existia, lógico, há muito ele já existia, era o único grupo de teatro que tinha a SCASA em Santo André. Até depois surgiu o Panelinha, surgiu o meu grupo, outros grupos que surgiram e desapareceram, tivemos festivais de teatro em Santo André com quinze, dezoito grupos de teatro e hoje em dia não existe mais, existem dois ou três. Acabou o movimento, a Prefeitura cortou tudo também, acabou com o teatro em Santo André praticamente, acabou com o festival de teatro adulto, acabou com o festival de teatro infantil, acabou com o festival de música, então ficou uma coisa deles, só deles; eles fazem o que eles querem, então terminou com o movimento que existia.

 

Pergunta:

E como eram esses festivais?

 

Resposta:

Era muito bom. Inicialmente, começou sendo onde era o Teatro de Alumínio, que era o SCASA. Naquela época era o único teatro que a gente tinha. Tinha Júlio de Mesquita também, foram feitas algumas coisas lá no teatro Júlio de Mesquita, e o SCASA que era o Teatro de Alumínio, até depois passou para o Cine Santo André e depois foi derrubado para passar a Perimetral ali, era super concorrido, tinha dezenas de grupos de  Santo André, São Bernardo, São Caetano. Era um movimento muito forte, muito grande de teatro amador em Santo André, mas acabou tudo.

 

Pergunta:

E os desfiles e bailes?

 

Resposta:

Os de Santo André acabaram, existem em cidades do interior.

 

Pergunta:

Você sabe quando acabou?

 

Resposta:

O último festival em Santo André foi um ano depois que saiu o Dr. Brandão, depois de um ano eles pararam com o festival, morreu praticamente a FEANTA que é a Federação Andreense do Teatro Amador também, que se desarticulou toda, acabou todo esse papo de a Prefeitura ajudar, prestigiar o teatro amador, acabou se desintegrando também. Então, a federação de teatro do ABC todo acabou desistindo.

No teatro municipal, com a Pop, a garota legal, com Silvio Caldas, Renato Sandrone.

 

Pergunta:

Hoje dá para viver de teatro?

 

Resposta:

Para alguns não é muito difícil. Eu vi uma peça agora da Mirian Pires e da Beatriz Segall que custa R$ 50,00 o ingresso, uma peça de uma hora e cinco minutos com as duas falando um monte de besteira lá, e o teatro lotado, elas vivem muito bem de teatro.

 

Pergunta:

Qual a alegria do teatro?

 

Resposta:

É sempre alegria quando você termina o espetáculo. Eu gosto muito quando eu termino um espetáculo e vejo que o resultado foi bom, ou através de festivais, ou através do próprio público que assiste e vê. Então é sempre uma alegria. Eu gosto. O prazer da gente é ver a coisa realizada e pronta. Agora eu estou dirigindo um texto, pela FEASA, aquele movimento que tem todo ano para ajuda assistencial, então a gente está montando uma peça em setembro, vamos lançá-la no Teatro Municipal e estrear também para benefício da casa de caridade, esse movimento que a FEASA faz anualmente. Então este ano sou eu que estou dirigindo.

 

Pergunta:

O senhor é filiado a alguma entidade de artistas?

 

Resposta:

Não. Sou filiado a Sbat, Sociedade de Autores Teatrais, e só; sou sindicalizado, tenho a DRT, tenho a carteira profissional.

 

Pergunta:

Pretende se aposentar no teatro?

 

Resposta:

Não, nem sei se teatro aposenta alguém.

 

Pergunta:

E a aposentadoria?

 

Resposta:

Aposentadoria eu já tenho, já sou aposentado, através das indústrias em que eu trabalhei; me aposentei pelas firmas em que eu trabalhei, pelo tempo de registro em carteira. De ator nem dá para você contar, porque mesmo que profissionalmente, em São Paulo são pouquíssimas, no Brasil pouquíssimas são as companhias que registram ator em carteira profissional assinada. Uma das companhias que eu sabia que fazia isso era a do Fagundes, que parou faz tempo, que registrava tudo direitinho. A maioria das peças de teatro é assim, eles juntam, alguém arruma patrocínio, arruma patrocinador e outros conseguem outras coisas e assim vai, não existe uma produção como nos Estados Unidos ou na Europa, você já entra desde o primeiro dia com carteira assinada fica um tempo determinado, horário de trabalho. Nada funciona desse jeito.

 

Pergunta:

O senhor pensou em desistir?

 

Resposta:

Não sei se chegou a esse ponto de pensar em desistir, mas na época da censura foi uma coisa que fez a gente parar para pensar se valia à pena fazer aquilo ou não. Às vezes por um ideal você desaparecia, como tantos amigos nossos foram presos, outros morreram, a Heleny Guariba, que era do Teatro de Alumínio, que desapareceu e que até hoje ninguém sabe onde ela foi parar; e a moça era filha de general, imaginem se não fosse, mas ela era do movimento mesmo, era batalhadora, ativista, então sumiu, acabou a Heleny Guariba. Foi no tempo da Sônia Braga, da Sônia Guedes, Petrin, a Silvia Borges. Eram todos daquela época, depois ela sumiu.

 

Pergunta:

O que o senhor gostaria de deixar registrado, com o seu depoimento, para os jovens e para as futuras gerações sobre a sua experiência de vida?

 

Resposta:

Não sei se tenho alguma coisa para deixar, mas o que eu acho que sempre vale a pena você ter um ideal, além do seu trabalho profissional, alguma coisa. Eu acho que a juventude devia ter sempre alguma coisa a mais, mesmo que fosse na arte, no esporte, na cultura em geral, uma preocupação com o ambiente, com a cidadania, mas um ambiente de se viver mesmo, pois estamos destruindo o dia-a-dia, dia a dia a cultura e a educação estão pior ainda. Estava estarrecido com as estatísticas da nossa cultura, da nossa educação, que está lá numa das últimas colocações mundial, perde para outros países sul-americanos. Eu acho que essa parte, um pouco de realismo, de construir alguma coisa, de participar de alguma coisa, a juventude perdeu tudo isso, e essa facilidade, e até as oportunidades, porque hoje em dia tem mais oportunidades que antigamente. Talvez pensar um pouco mais na vida em si, se preocupar com a saúde, porque hoje em dia infelizmente o que a gente vê de droga que está à solta na escola, faculdade, na rua, e a droga está acabando com a juventude. Então o que a gente espera é que tomem rumo. Então eu acho que é essa a preocupação que o jovem deve ter, não achar que a vida é só o vamos que vamos, mas que eles têm que se preocupar.


Acervo Hipermídia de Memórias do ABC - Universidade de São Caetano do Sul